Solo sagrado
Ouvi esta história de uma secretária de educação. Numa cidade do interior deste imenso país, crianças esperavam, com ansiedade, a inauguração de uma escola. Estudavam elas em espaços improvisados. Sem nenhum conforto nem estrutura. Mas estudavam. Ao lado, o novo prédio ia se erguendo. O tempo parecia não passar, mas, enfim, chegara o dia da inauguração. Festa da comunidade. A escola é um centro de luz que irradia saberes e futuros. Que prepara para a vida. Que edifica os alicerces de um mundo em construção. Famílias estavam presentes. Educadores entusiasmados.
Algumas semanas depois, a secretária foi visitar a escola. Quando estava chegando, viu a cena que a comoveu. Um menino simples, que viera caminhando em ruas de terra, tirou um pano da bolsa surrada que trazia algum material e limpou a sola dos chinelos antes de pisar no solo sagrado da escola. Não reparou que estava sendo observado. Fez isso por convicção. A secretária o abordou querendo saber onde ele aprendera aquilo. Ele, pleno de simplicidade, explicou que, naquele espaço, ele se preparava para crescer, para ser um homem de verdade, para dar orgulho aos seus pais que nunca puderam estudar e para cuidar deles, retribuindo todo o esforço que fizeram e ainda faziam por ele.
Ela me contou essa história com lágrimas nos olhos, dizendo que nos surpreendemos, todos os dias, com o que aprendemos com nossos alunos. Na simplicidade de um menino que reconhece o esforço dos pais e que se alimenta dos sonhos de amanhãs, preenchemo-nos de responsabilidades cientes de nosso poder de fazer a diferença na educação. Ter olhos de ver o que, de fato, acontece ao nosso redor, no solo sagrado de cada escola, na transformação cotidiana que somos capazes de realizar, na decisão inegociável de jamais desistir de nenhum aluno. É assim que educamos. É assim que renovamos nossos votos de que ser professor é professar a crença de que cada pessoa humana merece a oportunidade de ser feliz.
Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo)
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